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Homenagem a Steve: Integral do Discurso de Stanford

Steve Jobs. 56 anos. 36 anos de Apple. Ele mudou a vida de comunidades inteiras. E certamente alterou a face do desenvolvimento de software e da tecnologia em geral. Colocou as pessoas no centro das decisões, e a felicidade no centro da tecnologia. Como nossa homenagem a Steve, traduzimos colaborativamente uma das maiores falas – se não a maior – de um gênio comparável a poucos. Abaixo o texto integral de seu discurso realizado na cerimônia de graduação da Universidade de Stanford, em 2005. 


Sinto-me honrado de estar com vocês hoje, na formatura de uma das melhores universidades do mundo. Nunca me formei. Na verdade, isto é o mais próximo que já cheguei de uma formatura. Hoje gostaria de contar três histórias da minha vida; só isso. Nada de mais, apenas três histórias.

A primeira história é sobre como ligar os pontos.

Abandonei o Reed College depois de seis meses, mas fiquei como ouvinte por mais 18, antes de sair em definitivo. Então por que saí?

Tudo começou antes de eu ter nascido. Minha mãe biológica era uma jovem universitária, solteira, e decidiu me colocar para adoção. Ela queria muito que eu fosse adotado por pessoas formadas, e estava tudo preparado para que eu fosse adotado por um advogado e sua esposa. Acontece que, quando eu nasci, esse casal decidiu de última hora que o que queria mesmo era uma menina. 

Então meus pais, que estavam numa lista de espera, receberam um telefonema no meio da noite, perguntando: "Temos um bebê, um menino inesperado, vocês querem?" E eles disseram: "Claro que sim." Depois minha mãe biológica descobriu que minha mãe nunca tinha se formado e que meu pai não tinha sequer completado o ensino médio – e recusou-se a assinar os papéis de adoção. Só aceitou meses depois, quando meus pais prometeram que me colocariam na faculdade.

E 17 anos depois realmente entrei na universidade. Mas escolhi, ingenuamente, uma universidade que era quase tão cara quanto Stanford e toda a poupança dos meus pais (de classe média) estava sendo gasta em anuidades. Depois de 6 meses, parei de achar que valia a pena. Eu não sabia o que queria da vida e não fazia ideia de como a universidade ia me ajudar a descobrir. E lá estava eu gastando todo o dinheiro que os meus pais tinham economizado a vida inteira. 

Decidi sair, confiante de que daria tudo certo. Foi bem assustador naquele momento, mas em retrospectiva, foi uma das melhores decisões que fiz na vida. Ao abandonar a faculdade, pude deixar as disciplinas obrigatórias e participar apenas das que pareciam interessantes.

Mas não estava tudo maravilhoso. Eu não tinha um quarto no dormitório da faculdade e tinha que dormir no chão no quartos dos amigos. Retornava garrafas de Coca Cola para receber 5 centavos por garrafa devolvida e com isso comprar comida. Andava 10 quilômetros até o outro lado da cidade, toda noite de domingo, para conseguir uma refeição no templo Hare Krishna (eu adorava). 

E muitas das coisas com que me deparei ao seguir minha curiosidade e intuição foram extremamente valiosas depois. Vejam um exemplo.

O Reed College oferecia na época o melhor curso de caligrafia do país. Espalhados pelo campus, todos os posteres e panfletos eram escritos à mão com belas caligrafias. Já que eu havia abandonado o curso, não era obrigado a assistir às aulas regulares, então decidi ir às de caligrafia. Aprendi sobre fontes serifadas e não-serifadas, como variar o espaço entre as várias combinações de letras; sobre do que é feita uma grande tipografia. Era lindo, histórico, artístico – de uma maneira que a ciência não consegue explicar. Foi fascinante.

Nada disso tinha sequer possibilidade remota de ser aplicável na minha vida. Mas dez anos depois, quando estávamos criando o primeiro computador Macintosh, o que aprendi veio à tona. Incluímos tudo no projeto do Mac, que foi o primeiro computador em que a bela tipografia era valorizada. Se eu não tivesse abandonado a faculdade, o Mac nunca teria seus vários tipos de fontes e o espaçamento proporcional. E considerando que o Windows copiou o Mac, é possível que hoje nenhum computador pessoal os tivesse. 

Se eu não tivesse abandonado o curso, jamais teria me inscrito nas aulas de caligrafia e os computadores pessoais não teriam a tipografia maravilhosa que têm hoje. Obviamente, era impossível conectar os pontos olhando para o futuro, quando eu estava na faculdade. Mas fica muito claro ver a contribuição de tudo isso agora, dez anos depois.

De novo: não se pode conectar os pontos olhando para frente; só se pode fazer isso olhando para trás. Você deve confiar que os pontos vão se conectar em algum lugar no futuro; confiar em algo – na sua garra, destino, vida, carma, qualquer coisa. Esta forma de encarar as coisas nunca me deixou na mão, e tem feito toda a diferença em minha vida.

Minha segunda história é sobre amor e perda.

Eu tive sorte. Descobri o que eu gostava de fazer cedo em minha vida. Woz e eu começamos a Apple na garagem dos meus pais quando eu tinha vinte anos de idade. Trabalhamos muito, e em 10 anos a Apple cresceu de apenas dois numa garagem, para uma empresa de 2 bilhões de dólares, com mais de 4 mil funcionários. Tínhamos acabado de lançar nossa maior criação, o Macintosh, um ano antes; e eu tinha acabado de fazer 30 anos. 

E aí fui demitido. Mas como se pode ser demitido da empresa que você mesmo fundou? Bem, quando a Apple cresceu contratamos uma pessoa que eu achava muito talentosa, para administrar a empresa comigo, e durante o primeiro ano ou um pouco mais, as coisas correram bem. Mas depois, nossas visões do futuro começaram a divergir e terminamos nos desentendendo. Quando isso aconteceu, o Conselho da Apple ficou do lado dele. 

Então com 30 anos eu estava fora, muito, publicamente fora. O que tinha sido o foco de toda a minha vida adulta estava acabado. Foi devastador.

Eu fiquei sem saber o que fazer por algu meses. Senti que havia decepcionado os empreendedores da geração anterior – que eu tinha deixado cair o bastão que tinha recebido. Encontrei-me com David Packard e Bob Noyce e tentei me desculpar por ter arruinado tudo. Sentia-me como um fracasso muito público e pensei até em sair do Vale do Silício. 

Mas algo lentamente começou a surgir. Eu ainda amava o que fazia. Os acontecimentos na Apple não tinham mudado isso em nada. Eu tinha sido rejeitado, mas ainda estava apaixonado. Então decidi começar novamente. 

Na época não percebi, mas no fim das contas, ser demitido da Apple foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido.  O peso de ser bem-sucedido foi substituído pela leveza de ser novamente um principiante, com menos certeza sobre tudo. Isso me libertou para entrar em uma das fases mais criativas da minha vida.

Durante os cinco anos seguintes, iniciei uma empresa chamada NeXT, uma outra empresa chamada Pixar e me apaixonei pela mulher incrível que viria a ser minha esposa. A Pixar criou o primeiro filme animado por computadores, Toy Story, e é hoje o estúdio de animação mais bem-sucedido do mundo. Numa sequência de eventos memorável, a Apple comprou a NeXT, eu voltei para a Apple e a tecnologia que desenvolvemos na NeXT está no coração da renascença atual da Apple. E Laurene e eu temos uma família maravilhosa juntos.

Tenho certeza que nada disso teria acontecido se eu não tivesse sido demitido da Apple. Foi um remédio amargo, mas acho que o paciente precisava disso. Às vezes a vida acerta você na cabeça com um tijolo, mas não perca a fé. Estou convencido de que a única coisa que me fez seguir em frente foi o amor que sempre tive pelo que fiz. 

Você deve descobrir aquilo de que realmente gosta. Isso vale tanto para o seu trabalho, como para suas paixões. Seu trabalho  preencherá grande parte da sua vida, e a única maneira de ficar realmente satisfeito é fazer aquilo que você acredita ser um trabalho excelente. E a única maneira de fazer um excelente trabalho é amar o que faz. 

Se você ainda não encontrou, continue procurando; não se acomode. Como acontece para todos os assuntos do coração, você saberá quando o tiver encontrado. Depois, como ocorre em todo grande relacionamento, ficará cada vez melhor com o passar do tempo. Continue procurando até encontrá-lo; não se acomode.

Minha terceira história é sobre a morte.

Quando tinha 17 anos de idade, li uma citação que dizia algo como “Se você viver cada dia como se fosse o último, um dia definitivamente estará certo”. Isso me impressionou. Desde então, e pelos últimos 33 anos, ao olhar no espelho toda manhã me pergunto: “Se hoje fosse o último dia da minha vida, eu gostaria de fazer o que estou prestes a fazer hoje?” E sempre que a resposta era “Não” por vários dias seguidos, sabia que algo precisava ser mudado.

Lembrar que morrerei em breve é a ferramenta mais importante que encontrei para me ajudar a tomar grandes decisões na vida. Porque quase tudo – todas as expectativas, todo o orgulho, todo o medo de vergonha ou do fracasso – tudo simplesmente some diante da morte; o que resta é o que é realmente importante. Lembrar que você vai morrer em breve é a melhor maneira que conheço de evitar a armadilha de pensar que tem algo a perder. Você já está nu; não há motivo para não seguir o seu coração.

Cerca de um ano atrás fui diagnosticado com câncer. Fiz um exame às 7:30 da manhã que mostrou claramente um tumor no meu pâncreas. Eu nem sabia o que era um pâncreas. Os médicos disseram ser quase certo que fosse de um tipo incurável de câncer, e que eu sobreviveria por mais três a seis meses. Meu médico me aconselhou a ir pra casa e arrumar minhas coisas, que em linguajar médico significa preparar-se para morrer. Significa tentar dizer para os seus filhos, em alguns meses, tudo o que você pensou que teria os próximos 10 anos para dizer. Significa garantir que tudo está organizado para que o processo seja o mais tranquilo possível para sua família. Significa dizer adeus.

Passei o dia inteiro pensando nesse diagnóstico. Mais tarde, durante a noite, fiz uma biópsia, em que me enfiaram um endoscópio garganta abaixo, passando pelo estômago e intestino adentro. Colocaram uma agulha em meu pâncreas e tiraram algumas células do tumor. Eu estava sedado, mas minha esposa, que estava lá, disse que quando os médicos viram as células pelo microscópio, começaram a chorar; porque descobriram que se tratava de uma forma muito rara de câncer pancreático, que pode ser curada com cirurgia. Fiz a cirurgia e estou ótimo agora.

Foi o mais próximo que cheguei da morte, e espero que seja o mais próximo que chegarei por mais algumas décadas. Tendo passado por isso, posso dizer o seguinte a vocês, agora com um pouco mais de certeza que antes, quando a morte era um conceito útil mas puramente intelectual:

Ninguém quer morrer. Mesmo quem quer ir para o céu não quer morrer para chegar lá. A morte é o destino que todos compartilhamos; ninguém jamais escapou dela. E é assim que tem que ser, porque a morte é provavelmente a melhor invenção da vida; é o agente de mudança da vida. Ela limpa o que é velho para abrir caminho para o novo. Neste momento o novo são vocês, mas vocês um dia vão, gradualmente envelhecer e serão apagados. Desculpem por ser tão dramático, mas é verdade.

O seu tempo é limitado, por isso não o desperdice vivendo a vida de outra pessoa. Não caia na armadilha do dogma, que é viver com os resultados dos pensamentos dos outros. Não deixe que o barulho da opinião afogue sua voz interior. E o mais importante: tenha a coragem de seguir o seu coração e a sua intuição; eles de alguma maneira já sabem no que você realmente quer se tornar. O resto é secundário.

Quando eu era jovem, existia uma publicação fantástica chamada “O Catálogo de Toda a Terra (The Whole Earth Catalog), que foi uma das bíblias da minha geração. Foi criado por um sujeito chamado Stewart Brand perto daqui, em Menlo Park, que colocou vida nesse trabalho, com seu toque poético. Isso foi no final dos anos 60, antes dos computadores pessoais e da editoração eletrônica, então tudo era feito com máquinas de escrever, tesouras e câmeras Polaroid. Era uma espécie de Google em forma de livro, 35 anos antes do Google aparecer: era idealista e cheio de ferramentas interessantes e grandes ideias.

Stewart e sua equipe publicaram várias edições do Catálogo, e quando já tinham cumprido sua missão, lançaram uma edição final. Era meados dos anos 1970, e eu tinha a idade de vocês. A contracapa da edição final tinha uma fotografia de uma estrada de interior ensolarada, daquelas onde você poderia estar pedindo carona se fosse aventureiro. Embaixo estavam as palavras: "Continue Faminto. Continue Tolo." Foi a mensagem de despedida que deixaram ao sair. Continue Faminto. Continue Tolo. Sempre desejei isso para mim. E agora, no momento que se graduam para começar novamente, desejo o mesmo para vocês.

Continuem famintos. Continuem tolos.

Stay Hungry. Stay Foolish.

Muito obrigado a todos.


[Colaboraram nesta tradução Fernando Ultremare, Gustavo Castro, Julio Faerman, Leonardo Galvão e Mário Henrique Trentim. A inspiração para este artigo veio de um post de homenagem no Techcrunch.]

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